Um dos principais problemas do relacionamento abusivo é justamente notar que se está dentro dele. Com sinais nem sempre explícitos e uma atmosfera de insegurança pairando sobre quem é vítima deste tipo de relação, se desvencilhar de uma relação tóxica não é uma tarefa fácil. É preciso estar atento aos detalhes e notar os sinais de desrespeito e controle que o parceiro emite, mesmo que – como é bem comum – ele diga que a culpa do relacionamento estar com problemas é “toda sua”.

Foi pensando nisso que Valéria Scarance, promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo, criou uma cartilha chamada “Namoro Legal”. Disponível para download gratuito (nesse link), o documento aborda o tema, que é tão pesado, de maneira clara e com o cuidados especiais. Nas sete dicas práticas para que as jovens consigam identificar se um vínculo amoroso está se tornando tóxico, as palavras “violência”, “vítima” e “agressor” foram substituídas por sinônimos mais leves e que causem menos desconforto.

estupro marital

Público Alvo são as jovens

A atenção especial ao texto tem uma razão: a cartilha foi desenvolvida para atender as necessidades de meninas que estejam sendo dominadas pelo parceiro. Com as altas taxas de feminicídio e violência doméstica registradas no Brasil ano após ano, é de extrema importância que as jovens sejam orientadas desde cedo sobre o que é um relacionamento saudável e quais os sinais de que algo está errado.

Mesmo com a linguagem descontraída e leve, a publicação consegue manter a mensagem séria a que se propõe e deve ser utilizada como um instrumento de prevenção.

relacionamento abusivo

É preciso desconstruir modelos negativos

Dados divulgados pelo Ligue 180, canal do agora Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, mostraram que em 2018 quase 93 mil denúncias foram registradas por mulheres. Elas são vítimas de uma cultura de tolerância à violência. São pessoas que convivem diariamente com homens acostumados a cultivar relações tóxicas e que, muitas vezes, são levadas a acreditar que a situação não é tão grave quanto ela diz ser.

Isso nos leva a outro problema: essas mulheres são mães, tias, primas, irmãs, de outras mulheres. Que muitas vezes passaram toda a infância em um ambiente de medo e insegurança. Quando começam a cultivar suas próprias relações, elas tendem a repetir os padrões que observaram em casa e não conseguem sair desse ciclo, justamente por não conseguirem identificar que ele não é saudável.

Quando pensamos que esses dados do Ligue 180 representam um aumento de 25,3% em relação ao ano anterior, quando 73.669 denúncias foram registradas, e que uma boa parte das agressões sofridas por mulheres não são denunciadas, fica ainda mais evidente a necessidade de uma cartilha como a “Namoro Legal”.

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O que é uma relação abusiva

Se há diferença de poder entre as pessoas que estão em uma relação – principalmente as amorosas -, há um relacionamento abusivo. Um dos sinais que identificam esse tipo de situação é a agressão física, mas nem sempre ela está presente.

Um relacionamento abusivo vai além do óbvio da dor física e se estende ao sofrimento que ninguém pode ver. Abuso psicológico, chantagens, ciúmes, provocações, frases como “ninguém vai gostar de você como eu” ou “você é louca”, colocando em xeque a autoestima e a sanidade das vítimas, são comportamentos típicos de uma relação abusiva. Ao mesmo tempo, o agressor pode se mostrar parceiro e romântico, fazendo com que a vítima tenha dificuldade de identificar a situação que está vivendo.