O dia a dia de mulheres em todo o mundo não é nada fácil. Além da violência urbana, elas convivem também com a violência doméstica, o feminicídio, assédios e o medo constante de ser vítima de um abuso sexual. Agora, some a tudo isso o racismo e as situações que só são vividas por quem sente na pele o preconceito todos os dias. E as estatísticas comprovam: mulheres negras morrem expressivamente mais que as não negras.

O Brasil foi o último país ocidental a abolir a escravidão, em 1888, e até hoje a população negra sofre a marginalização: o preconceito é o responsável por menos oportunidades, pela falta de acesso adequado a direitos básicos e à educação, pela discriminação e pela marginalização.

Com as mulheres, essa realidade é ainda mais grave: até hoje são extremamente sexualizadas, preteridas em relação a mulheres brancas e socialmente pressionadas a se encaixarem em um padrão bem diferente de sua beleza natural.

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A equipe do Violência Social preparou um post especial sobre o assunto e você vai saber mais:

> Mulheres negras morrem mais que as brancas: entenda os números do preconceito;

> A solidão da mulher negra e o racismo sentido na pele;

> Os efeitos sociais e psicológicos de quem sofre com o preconceito;

> Saiba como denunciar os casos de violência racial.

 

Os números do preconceito

Mulheres negras morrem mais que as não negras. É o que aponta o Atlas da Violência 2018, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que traz dados referentes ao ano de 2016.

De acordo com o estudo, a taxa de homicídio de mulheres negras no país de 5,3 por 100 mil habitantes, número 71% maior que o registrado entre as mulheres não negras, cujo índice é de 3,1 por 100 mil habitantes. Em um período de dez anos, a taxa de assassinatos de mulheres negras aumentou 15,4%, enquanto a de brancas caiu 8%.

Nesse mesmo intervalo, a violência contra mulheres negras aumentou em 20 estados, sendo Goiás o lugar mais hostil para elas, com taxa de homicídio de 8,5, uma alta de 48% no número de assassinatos desse grupo em 10 anos. Entre as brancas, a taxa foi de 4,1.

O maior crescimento da violência contra mulheres negras foi em Roraima (alta de 214%), Rio Grande do Norte (142%) e Amazonas (134%).

População negra – As mulheres negras morrem mais que as brancas, mas a violência acontece contra essa população como um todo. Dos 62.517 homicídios que aconteceram em 2016, 71,5% das vítimas eram negros. O índice de assassinatos de negros foi de 40,2 e de 16 para o resto dos brasileiros.

Em dez anos, a média de homicídios caiu quase 7% entre os brancos, já a taxa de negros mortos violentamente cresceu 23%.

 

O racismo sentido na pele

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O preconceito contra mulheres negras se manifesta até mesmo nas oportunidades de trabalho

Ceder à pressão social, se encaixar em um padrão que não é o seu, não ser aceita da mesma maneira e com a mesma facilidade que outras mulheres. Esse é um dos tipos de violência que mulheres negras enfrentam desde a infância. A segregação e a marginalização começam muito cedo em uma sociedade que prega o preconceito, ainda que muitas vezes ele esteja velado.

Para a jornalista Denise Nascimento, essas questões estão ligadas diretamente à escravidão e ao racismo.

“Somos as que temos menos oportunidades dentro da sociedade em relação a empregos e posições de poder e, sendo assim, a maioria acaba por viver em periferias e em meio ao crime e violência. Infelizmente, ainda somos tidos como inferiores e isso é passado culturalmente para a sociedade. Só por sermos mulheres negras estamos diariamente sofrendo mais riscos ainda que os homens. É uma triste realidade”.

Solidão da mulher negra – Objetificada, marginalizada e sexualizada. Muito se fala sobre a solidão da mulher negra, que muitas vezes é vista como uma pessoa que não deve ser amada.

Diante do contexto de uma sociedade ainda racista, a solidão a acompanha desde a infância, quando sua beleza é questionada, padrões lhe são impostos e acontece o afastamento de outras meninas nascidas em lares preconceituosos – e que acabam disseminando esse comportamento desde cedo.

Para Denise, esse preconceito acontece vindo até mesmo de homens negros.

“A solidão da mulher negra é algo que está ligado diretamente a ela ser preterida dentre os padrões que são tidos como os mais aceitáveis e isso é uma grande realidade. Os homens, inclusive alguns deles negros, preferem sim as mulheres que são mais ligadas aos padrões (brancas, cabelos lisos, loiras). E acho que isso está longe de mudar , porque a mídia influencia padrões e nos coloca nessa posição por causa do nosso cabelo, da nossa cor. Isso é uma triste realidade, mas a nossa cultura e biotipo ainda é muito tido como algo estranho”.

 

Os efeitos do preconceito

Ser uma mulher negra e entender um cenário em que outras mulheres morrem constantemente pode gerar insegurança, medo e outros traumas que se perpetuam.

Para o médico e psicólogo Roberto Debski, essa realidade gera preocupação e orienta a necessidade de ações políticas, sociais e econômicas que revertam a situação de risco deste grupo.

Essa estatística reflete a difícil realidade de nosso país, no qual as mulheres negras, devido à condições socioeconômicas específicas, fazem parte de um grupo de risco mais suscetível à pobreza, baixo nível educacional, violência e mortes precoces. Toda forma de preconceito, racismo, e hostilização geram traumas pessoais, familiares, sociais e culturais, e se refletem na maneira como as pessoas se relacionam, consigo mesmas e com as outras pessoas, e geram consequências para todo país”.

Para o especialista, no entanto, esse é um quadro que pode mudar com orientação e ações governamentais.

“Sempre é possível reverter a violência quando se entendem suas origens e são feitos movimentos para coibir o preconceito, e são promovidas ações de inclusão e educação em larga escala”.

 

Mudança começa pela denúncia

Mulheres negras morrem diariamente e o racismo segue disseminado. É possível mudar essa realidade denunciando os culpados. Saiba como relatar casos de racismo:

  • Ligue para a Polícia Militar pelo 190;
  • Você também pode acionar o Disque Denúncia por meio do número 181;
  • Reúna provas e registre um boletim de ocorrência na delegacia mais próxima.

 

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