Taís Araújo, Ludmilla, Preta Gil e Juliana Alves. Você sabe o que todas elas têm em comum? Além da fama e do sucesso, uma legião de fãs acompanha seus trabalhos dentro e fora da grande mídia. Mas não são somente os admiradores seguem de perto as artistas. Todas elas foram vítimas de haters das redes sociais e viram de perto os agressores irem além das críticas e cometeram crimes de racismo. Cabelo, cor e tipo físico das atrizes e das cantoras foram alvos das injúrias racistas de criminosos que se aproveitaram do anonimato por trás de uma tela de computador ou smartphone.

No final de outubro de 2015, a atriz Taís Araújo recebeu comentários preconceituosos de diferentes perfis em uma foto que havia publicado no Instagram. Milhares de pessoas saíram em defesa da atriz, que na época fez um desabafo pela mesma rede social.

Thais Print

“É muito chato, em 2015, ainda ter que falar sobre isso, mas não podemos nos calar. Na última noite, recebi uma série de ataques racistas na minha página. Absolutamente tudo está registrado e será enviado à Polícia Federal. Eu não vou apagar nenhum desses comentários. Faço questão que todos sintam o mesmo que eu senti: a vergonha de ainda ter gente covarde e pequena neste país, além do sentimento de pena dessa gente tão pobre de espírito. Não vou me intimidar, tampouco abaixar a cabeça”

Em março deste ano, cinco suspeitos foram detidos e o crime segue sob investigação da Polícia Civil.

A cantora Ludmilla e a atriz Juliana Alves, em maio e em agosto deste ano, respectivamente, sofreram injúrias raciais também pelo Instagram. Ambas denunciaram os agressores, que estão sendo investigados.

Em julho, Preta Gil teve seu perfil do Facebook invadido por um grupo racista, que disparou uma série de ofensas contra a cantora, que também denunciou o caso.

Você sabe como denunciar crimes de violência racial?

Se você foi vítima ou conhece alguém que sofreu racismo, esse artigo vai mostrar tudo aquilo que você precisa saber e fazer para colaborar para que os criminosos sejam punidos.

⇒ Você vai entender como a polícia trabalha para chegar aos agressores de crimes virtuais e como funcionam as punições;

⇒ Verá o passo a passo de medidas que devem ser tomadas caso você sofra violência racial na internet;

⇒ Saberá mais sobre o perfil de agressores;

⇒ Entenderá mais sobre crimes raciais, consequências e traumas sofridos pelas vítimas.

POR QUE ACONTECE O RACISMO?

O racismo é uma estratégia de poder que utiliza a noção de raça para segregar e oprimir. A ideologia coloca de lado história e aspectos sociais de nossas origens: de um lado, exclui o negro, por outro, consome suas comidas, músicas, festas e toda a herança extremamente intrínseca em nossa cultura.

Para a psicóloga Ingrid Geraldo da Silva, nesse sentido, a violência racial não atinge somente a pessoa envolvida na ocasião, mas toda sua história de vida e seus antepassados.

“No imaginário social, o negro sempre esteve associado ao que é ruim, refletindo mesmo na linguagem: a coisa está preta, humor negro, um futuro negro. Desde muito novos a sociedade nos apresenta esse linguajar que nos faz reproduzir sem nunca refletir sobre o que isso quer dizer”

A psicóloga explica que tudo aquilo que é aprendido sem reflexão e reproduzido gerando o ódio pode acabar com uma mudança coletiva de consciência e de comportamento. Segundo Ingrid, não nascemos racistas, aprendemos a ser assim. Dessa mesma forma, podemos deixar de sê-lo.

“É momento de refletir sobre nossa história e começar a olhar o outro como possibilidade de interação e afeto. Só assim diminuiremos as formas de violência”.

Ingrid explica, ainda, que não há um perfil específico de quem comete esse tipo de crime. O indivíduo que age com violência racial, seja ela física ou verbal, pode ser uma pessoa que cresceu em um ambiente onde a violência e a discriminação social estão presentes, mas isso não é determinante”, afirma a psicóloga.

“São indivíduos que negam sua própria história e precisam agredir para se sentirem fortes. Geralmente são pessoas que vivem no anonimato, sem nome e sem rosto”.

CONSEQUÊNCIAS PARA AS VÍTIMAS

A violência racial deixa efeitos negativos naqueles que passam por isso. Para mudar as consequências desse sofrimento é necessário promover a valorização da identidade, o pertencimento racial, o exercício da cidadania e o orgulho da essência.

“Os efeitos da violência racial em quem as sofre são avaliadas caso a caso, mas podem gerar inúmeros traumas. Desde a vontade de não querer mais se relacionar com as pessoas (fobia social) até o extremo de tirar a própria vida”.

O grau dos efeitos dependerá da forma como o envolvido responderá à situação. As pessoas se sentem excluídas e isso reflete na baixa autoestima e na falta de estímulo para realizar suas atividades.

“ É necessário apoio familiar, de amigos e terapia também se faz necessária para busca de pertencimento e reestruturação psíquica do indivíduo. São danos que podem durar anos, mas podem também ser amenizados e extintos com ajuda especializada”, Ingrid Geraldo da Silva.

PUNIÇÕES DOS CRIMINOSOS

A internet tem sido cenário dos principais casos de violência racial que vieram a público nos últimos tempos. Isso porque a rede mundial de computadores oferece uma falsa sensação de anonimato e poder a quem pratica esses crimes.

No entanto, assim como nossa identidade diz quem somos, nossos dados nos provedores de acesso e nas redes sociais são capazes de ir além: dizem quem somos, falam sobre nossos acessos, preferências e muito mais.

Especialista em segurança da informação e perito em computação forense, Gilberto Sudre explica que, sigilosamente, nossos dados são mantidos nos provedores de acesso por seis meses, enquanto que os provedores de redes sociais devem mantê-los armazenados por um ano.

Em caso de crime, mediante solicitação de um advogado ou delegado, o juiz pode determinar que esses provedores forneçam as informações de seus usuários suspeitos. Dessa forma, é iniciada a investigação e é possível chegar aos criminosos”, Gilberto.

Criminalmente, as ofensas racistas, sejam elas por meio das redes sociais ou não, são enquadradas como injúria racial e tem pena máxima de oito anos de reclusão.

“O racismo sempre existiu, mas com a internet esse tipo de crime de ódio tem ganhado mais voz. Por se tratar de uma plataforma virtual, a repercussão e o constrangimento são muito maiores e isso pode tornar a punição maior”.

cyber bully

COMO DENUNCIAR?

Foi vítima de algum tipo de injúria racial? Denunciar os agressores é fundamental para que esse tipo de violência acabe, no entanto, o especialista alerta para detalhes importantes na hora de reunir provas contra aqueles que cometeram o racismo:

1 – A atitude mais comum, no caso da violência virtual, é fazer uma captura da tela onde a ofensa aparece. No entanto, para Sudre, essa é uma prova frágil, uma vez que muitas adulterações e montagens são feitas nos chamados printscreen.

“O ideal é que seja feita uma ata notarial sobre o caso, antes de qualquer outra medida, para que não haja tempo de o agressor retirar a postagem. A vítima deve ir até o cartório de sua cidade e pedir ao tabelião que acesse o perfil e veja a ofensa – ou, em casos de aplicativos de mensagens, é possível mostrar o smartphone. Ele mesmo fará a captura de tela ou descreverá todas as ofensas que vê em um documento oficial que terá validade ainda que a injúria seja apagada”

2 – Feita a ata notarial, a vítima deve procurar um advogado especializado em crimes digitais e, então, uma delegacia também especializada. Nas cidades em que não há esse tipo de serviço, é possível efetuar o boletim de ocorrência em uma delegacia normal, que posteriormente encaminha para investigação direcionada.

“Geralmente, os agressores são grupos radicais sem conhecimento profundo de que podem, sim, serem encontrados, ainda que a investigação possa demorar. Vejo que as pessoas não têm ideia do enorme alcance das redes sociais”, finaliza o especialista.