Um personagem assustador, que aparece no meio de vídeos infantis e ensina as crianças a se suicidarem. É com essa premissa aterrorizante que a Momo se tornou a personagem mais falada da última semana na internet. Mas será que esses vídeos de fato existem? As crianças estão em risco?

Para que os pais possam entender como proteger os pequenos de ameaças virtuais preparamos o artigo a seguir com tudo o que já se sabe sobre a Momo e quais os cuidados devem ser tomados para garantir a segurança dos filhos.

No texto a seguir você vai encontrar:

  • Quem é a Momo?
  • Como ela se tornou famosa?
  • O retorno de Momo
  • A divulgação não intencional dos pais
  • Como as crianças a conheceram
  • O YouTube Kids é seguro?

Metade mulher, metade pássaro

Partindo bem do início dessa história, precisamos contar que a Momo não foi criada para assustar ninguém. Pelo menos não dessa forma. A imagem que circula pela internet, de uma mulher de cabelos escuros, olhos grandes e uma boca com formato estranho é parte de uma escultura japonesa, feita por Keisuke Aisawa e exposta no museu Vanilla Gallery, em Tóquio, sob o nome de “Guai Bird”. Pois é, nada de Momo.

Ela é inspirada em uma lenda urbana japonesa, que se chama “Ubume” e fala de uma mulher que morre durante o parto e volta à vida num corpo deformado, metade humana, metade pássaro.

Ou seja, ela tem o objetivo de ser sombria, mas nunca foi criada com o intuito de assustar criancinhas na internet. Na verdade, o escultor não esperava nem que ela se tornasse famosa em todo o mundo. A obra inclusive foi criada com materiais não duráveis e nesse momento já se encontra no lixo.

Mas então, como foi que ela se tornou famosa?

A Momo, com esse nome, apareceu pela primeira vez na internet em 2018 por meio de um perfil de Whatsapp, criado no México, que usava a imagem da personagem para se comunicar com pessoas aleatórias e disseminar um desafio, que consistia em conversar com ela, que dizia ser um demônio, durante a madrugada.

O desafio se tornou viral e fez com que autoridades de todo o mundo alertassem pais e responsáveis para as mensagens de conteúdo violento e de incentivo ao suicídio que eram enviadas durante essas conversas.

Como tudo o que acontece na internet, a Momo virou um fenômeno, youtubers de todo o planeta gravaram vídeos conversando com o tal número misterioso, até que – em um passe de mágica – ela sumiu. Nada que nunca tenhamos visto em outros casos virais. A Momo tinha um prazo de validade e quando outro assunto mais interessante apareceu, ele expirou.

desafio da momo

O retorno de Momo

Acontece que, em um movimento inesperado, ela voltou ao dia a dia das famílias, dessa vez com uma ameaça ainda mais grave: a de estar “escondida” em vídeos do YouTube Kids com um discurso de incentivo, bastante didático, ao suicídio.

Não é de se espantar que pais de todo o Brasil tenham se alarmado e repassado o alerta para as pessoas conhecidas. Hoje em dia todas as crianças assistem ao YouTube. É de lá que vem os grandes sucessos como a Galinha Pintadinha, o Bita, o Baby Shark. O YouTube faz parte da rotina das famílias e a possibilidade de ter um conteúdo tão danoso inserido nos vídeos infantis tirou o sono de muitos adultos.

Os pais ajudaram a disseminar o boato

Acontece que não há nenhuma evidência de que esses vídeos estejam hospedados no YouTube Kids, que é a versão da plataforma destinada para menores de 13 anos e que conta com filtros bem mais rigorosos do que a convencional.

Pessoas mal intencionadas realmente editaram alguns vídeos famosos, principalmente de slime e o Baby Shark, e incluíram as imagens da Momo ensinando as crianças a pegarem facas e cortarem os próprios pulsos, mas esses materiais foram compartilhados pelo Whatsapp. E foram os próprios pais que sem querer fizeram com que eles ficassem famosos, com uma chuva de compartilhamentos em grupos de escola, perfis do Facebook, Instagram… Com medo de que as crianças vissem o conteúdo, os adultos o transformaram em viral.

Para deixar a situação ainda mais complicada, veículos de imprensa extremamente conceituados replicaram a notícia espalhada pelas redes sociais e deram força para que o boato fosse ainda mais longe.

Atualmente muitos deles já se retrataram e disseram que nenhuma URL foi encontrada no YouTube Kids contendo esses vídeos. O Ministério Público, o Google e as próprias equipes de reportagem hoje são unânimes: a Momo não está na plataforma infantil.

adolescentes na internet

Mas então como as crianças a conheceram?

Por mais que o YouTube Kids esteja “limpo” nessa história, é um fato que crianças tiveram sim acesso ao personagem. O filho da professora Renata Valente é um deles.  

“Há uns três meses encontrei um desenho da Momo aqui em casa, feito pelo meu filho de 5 anos. Ele gosta muito de desenhar. Eu perguntei pra ele, que desconversou e disse que nunca tinha visto nada sobre ela, só sabia quem era a personagem. E na época, o assunto passou. Mas na sexta-feira passada recebi em um grupo de pais da escola o vídeo infantil que contém a Momo. Sentei com ele para conversar, perguntei se ele já tinha visto e tentei mostrar as imagens. Ele não quis ver, gritou, me disse que era muito feio e que não queria assistir. Percebi então que alguém já devia ter falado com ele sobre os vídeos. Ele estava muito assustado. Na segunda-feira ele chegou da escola dizendo que as outras crianças estavam falando sobre isso e que muitas não tinham assistido, mas que o YouTube estava proibido pra elas”, conta.

Renata, que trabalha na área da educação e tem um marido especialista em TI se preocupa em colocar filtros de acesso à internet compatíveis com a idade das crianças e todos os dias confere os históricos de navegação dos dois filhos e nunca encontrou nada relacionado à Momo ou qualquer outra atividade prejudicial online.

O que provavelmente aconteceu com o filho de Renata, e que aconteceu com muitos outros, foi que a Momo deve ter sido apresentada por algum colega que a viu nas redes sociais ou mesmo recebeu os vídeos pelo Whatsapp. São casos de crianças utilizando aplicativos que não são próprios para a sua idade.

Então o YouTube Kids é seguro?

De acordo com Vinícius Camacho, consultor de cibersegurança e privacidade da empresa Midri, o YouTube Kids tem alguns filtros que, somados a configurações manuais, ajudam a evitar acesso a conteúdos impróprios pra crianças.

“Dentre os filtros está o controle do que as crianças pesquisam, já que os pais podem bloquear o acesso à lupa e também a busca por voz. É possível também denunciar o vídeo (nos três pontinhos que aparecem no canto superior direito da tela), bloqueando o vídeo ou até mesmo o canal. Dessa forma o conteúdo é removido automaticamente do perfil. Há também um temporizador, que limita o tempo de uso por parte dos pequenos. Não é um filtro de conteúdo, mas é um controle importante”, explica.

Na descrição do aplicativo, o YouTube Kids diz que estão disponíveis muitas opções de controle parental que permitem criar uma experiência adequada para toda a família, como opções de conteúdo para crianças mais novas, possibilidade de denúncia de vídeos e comentários impróprios, dentre outros. Porém, o Google assume: A aplicação foi concebida para filtrar os vídeos impróprios para crianças, mas não existem sistemas perfeitos.

“Ou seja, os pais não podem confiar cegamente em nenhuma tecnologia, precisam aprender a configurar e monitorar da melhor forma e estar sempre atentos às potenciais fragilidades. Uma dica para os pais é não deixar o aplicativo convencional do YouTube e o navegador Chrome com livre acesso no dispositivo que a criança usa, pois ela pode acessar o YouTube por eles e assim burlar todos os filtros do Kids. É preciso também ter o cuidado adicional de proteger esses aplicativos com senha. O aplicativo AppLock, por exemplo, é gratuito e ideal pra essa medida extra de precaução”, finaliza o especialista.

Com tudo isso, o que podemos concluir é que a Momo é uma lenda urbana, como a Loira do Banheiro. E assim como a Loira não vai aparecer para crianças que falam palavrão dentro do banheiro, a Momo não vai invadir os vídeos feitos para menores. Mas isso não significa que pais e responsáveis podem deixar as crianças navegarem livremente. A responsabilidade pelo conteúdo que seu filho consome é inteiramente sua, os filtros só estão lá para ajudar.